Feridos pelos mesmos espinhos - Carta de Juscelino a Carlos Lacerda
|
|
"Feridos pelos mesmos espinhos" 13/08/2008 - Tribuna do Norte
Ticiano Duarte – Jornalista
Lendo "Minhas cartas e as dos outros", de Carlos Lacerda, organizado por Túlio Vieira da Costa, navego no tempo de reminiscências de fases históricas, com a presença marcante do grande jornalista e político da oposição.
No capítulo, onde estão transcritas as missivas trocadas, por Juscelino Kubitschek e Carlos Lacerda, fico encantado com a beleza dos gestos dos dois antigos adversários e contendores, quando da organização da Frente Ampla, em 28 de outubro de 1966, com a participação ainda de Jango.
Três ferrenhos inimigos políticos que se enfrentaram ao longo do tempo e que, durante o regime dominante, num momento especial da história republicana, quando as liberdades públicas estavam sendo violentadas, uniram-se com a finalidade patriótica de por fim ao estado de coisas de exceção, que se estava implantando, desviando-se segundo Lacerda, dos rumos que levaram os militares a impedir a suposta tentativa, de levar o país a um regime totalitário, de inspiração esquerdizante e sindicalista.
Apesar das incompreensões por parte dos seguidores de Lacerda, mais dos que aos ligados a Juscelino e Jango, o ex-governador da Guanabara indagado a respeito por um filho sobre a utilidade do seu gesto, tão ousado diante da repressão prevista, ele respondeu que o efeito seria a longo prazo.
A história provou que Lacerda estava certo. De fato aconteceu o previsto. Ele foi cassado pelo Ato Institucional, mas, o efeito deu certo. Durante 20 anos, é verdade, no inicio da década de 80, explodiu a campanha Diretas Já. E depois, a eleição de Tancredo Neves, pondo fim ao regime de exceção.
As divergências de Jango e Lacerda tinham origens. Um era o herdeiro de Getúlio Vargas e o outro cresceu combatendo o ex-ditador. E a distancia de Juscelino e Lacerda, antes da ditadura militar? Participavam de siglas partidárias diferentes, PSD e UDN. Em 1956, Juscelino Presidente da República, cassou o direito de Lacerda de ir livremente à televisão, fato que desmentiu a justa fama de tolerância do ex-presidente. O Tribunal Superior Eleitoral declarou o ato inconstitucional, a 01 de setembro, de 1958.
Em certas fases, os dois andaram conversando. Juscelino uma vez ofereceu-lhe a Prefeitura do Rio de Janeiro, então Distrito Federal, em troca do seu apoio, em 1955, à Presidência da República.
Reencontraram-se na Frente Ampla. Em setembro de 1973, Juscelino em carta, dizia: "Feridos pelos mesmos espinhos... surpreende-me que não tenhamos sidos amigos há mais tempo". Carlos Lacerda responde no mesmo mês e no mesmo ano, declarando que a carta recebida foi: "um dos mais belos documentos de minha vida".
Mas, belo é o artigo de Carlos Lacerda, publicado na "Folha de São Paulo", no dia seguinte à morte de Juscelino, 23 de agosto de 1976. Dizia o jornalista, "que foi a Lisboa apertar a mão do exilado que combatera quando ele estava no poder... Seus erros não foram menos do que os que são praticados pelos que renegaram seus compromissos com a democracia. Seus acertos sim, foram muitos maiores. Na desgraça, ele cresceu. E na própria morte, deixou uma lição, a de que é impossível, isso sim, substituírem líderes autênticos por praticantes da arte de adular...".
Gosto de rememorar as figura de políticos que se engrandeceram pela vocação para a liberdade, para a tolerância. A vocação de apreço pela inteligência.
Por isso, no Rio Grande do Norte, não se pode esquecer, em períodos mais distantes, dos nomes de Pedro Velho, Alberto Maranhão, José Augusto, Juvenal Lamartine, Dinarte Mariz, Dix-sept Rosado, Silvio Pedroza, Aluízio Alves e Walfredo Gurgel.
|
|